Avaliação da cifose torácica em mulheres idosas portadoras de osteoporose
O envelhecimento pode ser definido como um processo irreversível, caracterizado por alterações funcionais e estruturais de diversos órgãos e sistemas que variam de um indivíduo para outro. Dentre essas alterações, está presente em ambos os sexos, porém com maior intensidade no sexo feminino, a redução da massa óssea a partir da quarta década de vida, período em que o processo de reabsorção óssea começa a preponderar sobre o processo de formação do osso, levando à diminuição fisiológica da massa óssea. Esse desequilíbrio na remodelagem óssea de forma mais intensa é denominado osteoporose 2. O desenvolvimento deste estudo foi motivado pelo interesse em identificar a influência da osteoporose no grau de cifose torácica. A osteoporose é uma doença osteometabólica que atinge especialmente as mulheres após a menopausa, sendo caracterizada pela diminuição da densidade óssea e pela deterioração da sua microarquitetura de forma progressiva e sistêmica, levando à fragilidade do osso e aumentando o risco de fraturas3.
No Brasil, estima-se que a osteoporose afete em torno de 35% das mulheres após os 45 anos de idade4.
Um dos critérios diagnósticos precoces da osteoporose proposto pela Organização Mundial de Saúde (OMS), é a medida da densidade mineral óssea (DMO) por meio da densitometria ossea 5,6, um método capaz de medir a quantidade de osso (conteúdo mineral) em uma área ou volume definidos em valores absolutos (g/cm²)1.
A diminuição da densidade óssea das vértebras leva a uma redução da região anterior dos corpos vertebrais, resultando em compressão e colapso dessas vértebras, com estreitamento dos discos e espaços intervertebrais, o que determina uma série de deformidades na coluna e modificações posturais, dentre as quais se pode destacar o aumento da cifose torácica7. Essa alteração torna-se significativamente maior com o avançar da idade e após a menopausa, sendo definida como um aumento da curvatura no plano sagital da coluna torácica 8,9.
Imagens radiográficas têm sido utilizadas para a mensuração da cifose torácica, porém com algumas desvantagens desse método, como: exposição à radiação; qualidade da imagem radiográfica não satisfatória, dificultando a sua análise, e a ausência desse equipamento no ambiente clínico fisioterapêutico para o acompanhamento evolutivo do tratamento 9-19,motivando assim a busca por métodos não invasivos para a avaliação das curvas da coluna, dentre eles a biofotogrametria computadorizada 12-16.
Segundo a American Society of Photogrammetry, a biofotogrametria computadorizada é "a arte, ciência e tecnologia de informação confiável sobre objetos físicos e o meio ambiente através de processos de gravação, medição e interpretação de imagens fotográficas e padrões de energia eletromagnética radiante e outras fontes" 14. É um instrumento de avaliação muito utilizado por quantificar as alterações posturais por meio da aplicação dos princípios fotogramétricos às imagens fotográficas obtidas em movimentos corporais, complementando a avaliação para o diagnóstico fisioterapêutico em diferentes áreas 17.
O presente estudo teve por objetivo mensurar o grau de cifose torácica em mulheres idosas portadoras e não portadoras de osteoporose na coluna por meio da biofotogrametria computadorizada e verificar a diferença entre os valores obtidos, tendo como hipótese maior grau de cifose torácica em mulheres osteoporóticas.
Avaliação do grau de cifose torácica
Para a avaliação quantitativa do grau de cifose torácica, foi utilizada a biofotogrametria computadorizada, seguindo a metodologia proposta por Vieira 18. Os registros fotográficos foram realizados com um sistema de vídeo digital por meio de uma placa Pctu da marca pinacle, responsável pela conversão da imagem analógica em digital, e uma câmera filmadora HandyCam vision (Sony Zoom digital 460X Optical 20X), posicionada paralela ao chão, sobre um tripé nivelado. A sala bem iluminada e reservada permitiu a privacidade das mulheres fotografadas.
Para o registro fotográfico, as participantes permaneceram em ortostatismo à frente do simetógrafo, sendo posicionadas em local previamente demarcado. A câmera foi posicionada a 2,86 m de distância, o tripé a uma altura de 72 cm do chão, permitindo fotografar o corpo inteiro. Os marcadores utilizados foram constituídos por uma haste de 5 cm presa a uma base cilíndrica de coloração vermelha, com 3,5 cm de comprimento por 2 cm de largura, presos por uma fita adesiva dupla face nos pontos visualizados no plano sagital. As imagens foram capturadas pelo programa PlayTV USB Pro TV v1.18.
Para a mensuração do grau da cifose torácica, foram fixados os marcadores cutâneos perpendiculares sobre o processo espinhoso da sétima vértebra cervical (C7) e na 12 o vértebra torácica (T12). Todos os registros fotográficos foram realizados por um único fotógrafo, e os marcadores, posicionados sempre pelo mesmo examinador que desconhecia o grupo a que pertenciam as voluntárias.
Em seguida, foi realizado o registro fotográfico dessas marcações com as voluntárias no plano sagital direito, trajando maiô ou peças íntimas. Os registros fotográficos digitais selecionados foram inseridos em um programa específico (Autocad 2006), sendo o examinador treinado para sua correta utilização. Esse programa permitiu traçar duas retas paralelas aos marcadores de C7 e T12, sendo a intersecção entre elas o ângulo que representou o grau de cifose torácica, quantificado com alta precisão (Figura 1).
Discussão
A osteoporose é uma condição comum em 1/3 das mulheres brancas acima dos 65 anos e após a menopausa, sendo a sua principal complicação as fraturas do corpo vertebral 4, que intensificam a cifose torácica 19. Cortet 20, verificou que mulheres osteoporóticas pós-menopausa com pelo menos uma fratura apresentam um aumento significativo da cifose torácica (63°) em relação às mulheres sem osteoporose (52°), valores semelhantes aos obtidos no presente estudo. Bartynski et al. 19 observou em mulheres saudáveis, com mais de 65 anos, sem fraturas vertebrais, um grau médio de cifose torácica menor (43,6°), o que demonstra que mulheres osteoporóticas com fraturas vertebrais apresentam um aumento do grau de cifose torácica comparadas às mulheres da mesma idade e saudáveis. Itoi e Sinaki 21 afirmam que mulheres saudáveis pós-menopausa que apresentam um grau de cifose torácica maior ou igual a 34,1° podem ser consideradas hipercifóticas e ressaltam que mulheres idosas portadoras de osteoporose apresentam um grau médio de cifose torácica superior a 37,1°. Já Kostuik22 e Plapler23, demonstraram que mulheres com um grau de cifose torácica superior a 40° podem ser consideradas hipercifóticas. Granito24 verificou um maior grau médio de cifose torácica nas mulheres portadoras de osteoporose (54,93°) quando comparados às mulheres portadoras de osteopenia (45,1°).
A imagem radiográfica é o método mais utilizado para avaliar o grau de cifose torácica (Ângulo de Cobb), tendo o grau de convexidade torácica normal valores que variam de
20º a 50º 8,9.
A avaliação postural é essencial para qualquer planejamento de intervenção fisioterapêutica e para o acompanhamento da sua evolução13. A biofotogrametria computadorizada é um método que apresenta duas grandes vantagens na efetividade de sua aplicação clínica; baixo custo do sistema de fotointerpretação de imagens e a precisão e reprodutibilidade dos resulta-
dos25, motivos pelos quais se elegeu esse método de avaliação.Granito et al. 7 utilizaram esse instrumento de avaliação, obtendo em seus resultados um grau médio de 58,19º de cifose torácica em mulheres idosas osteoporóticas, valor inferior ao obtido neste estudo.
Com o processo natural do envelhecimento, várias alterações são identificadas no indivíduo idoso, como a diminuição da densidade mineral óssea do corpo vertebral, a degeneração dos discos intervertebrais, uma redução da capacidade dos ligamentos da coluna vertebral26, um déficit proprioceptivo24 e a fraqueza dos músculos extensores do tronco7,24,27, sendo essas alterações consideradas justificativas para a presença de cifose torácica em mulheres idosas sem osteoporose.
Mulheres idosas portadoras de osteoporose apresentam, associados ao envelhecimento, colapsos vertebrais, que irão resultar em modificações posturais, incluindo o aumento da cifose torácica que contribui para uma diminuição da estatura em torno de 10 a 20 cm27. Assim sendo, o aumento do grau de cifose torácica é desencadeado pelo envelhecimento e exacerbado pela osteoporose26, o que explica a presença de maior grau de cifose torácica nas mulheres idosas portadoras de osteoporose avaliadas neste estudo. Itoi e Sinaki21 relataram uma significativa correlação negativa entre os músculos extensores da coluna e a cifose torácica em mulheres saudáveis pós-menopausa, também demonstrado por Granito et al.7. Davini e Nunes28 afirmam que a massa de músculo esquelético tem grande influência na densidade mineral óssea; assim, a maior prevalência da osteoporose nas mulheres poderia ser explicada, em parte, por menor quantidade de massa musculoesquelética que elas apresentam29-31.
A influência da atividade física na prevenção e no tratamento da osteoporose tem sido demonstrada em diversos trabalhos por meio do ganho ou da manutenção da massa óssea, do aumento de força muscular, da flexibilidade, da melhora da coordenação e do equilíbrio, importantes para evitar o risco de quedas e consequentemente de fraturas2,24,32. O exercício físico deve ser sempre estimulado nos indivíduos idosos para a prevenção e tratamento da osteoporose, além da melhora da qualidade de vida, diminuindo, assim, as inúmeras consequências que o envelhecimento e a osteoporose poderão causar, como o aumento da cifose torácica.
Conclusão
Tendo em vista os resultados encontrados neste estudo, conclui-se que a osteoporose acentua o grau de cifose torácica. Sugere-se a biofotogrametria computadorizada como uma opção não invasiva para a avaliação quantitativa do grau de cifose torácica na prática fisioterapêutica.
Bibliografia
1. Freitas EV, Py L, Néri AL, Cançado FAX, Gorzoni ML, Rocha SM. Tratado de Geriatria e Gerontologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2002.
2. Navega MT, Aveiro MC, Oishi J. Alongamento, caminhada e fortalecimento dos músculos da coxa: um programa de atividade física para mulheres com osteoporose. Rev Bras Fisioter. 2003;7(3):261-7.
3. Gali JC. Osteoporose. Acta Ortop Bras. 2001;9(2):53-62.
4. Paiva LC, Filardi S, Pinto Neto AM, Sâmara A, Marques Neto JF. Impact of degenerative radiographic abnormalities and vertebral fractures on spinal bone density of women with osteoporosis. São Paulo Méd J. 2002;120(1):9-12.
5. Zanette E, Stringari FF, Machado F, Marroni BJ, Ng DPK, Canani LH.
Avaliação do diagnóstico densitométrico de osteoporose/osteopenia conforme o sítio ósseo. Arq Bras Endocrinol Metab. 2003;47(1):30-6.
6. Pinto Neto AM, Soares A, Urbanetz AA, Souza ACA, Ferrari AEM, Amaral B, et al. Consenso brasileiro de osteoporose 2002. Rev Bras Reumatol. 2002;42(6):343-54.
7. Granito RN, Rennó ACM, Aveiro MC, Navega MT, Driusso P, Oishi J. Efeitos de um programa de atividade física na postura hipercifótica torácica, na dorsalgia e na qualidade de vida de mulheres com osteoporose. Rev Bras Fisioter. 2004;8(3):231-7.
8. Teixeira FA. Validação do método flexicurva para avaliação angular da cifose torácica [dissertação]. Brasília (DF): Universidade Católica de Brasília; 2006.
9. Teixeira FA, Carvalho GA. Confiabilidade e validade das medidas da cifose torácica através do método flexicurva. Rev Bras Fisioter. 2007;11(3):199-204.
10. Wilner S. Spinal pantograph: a non-invasive technique for describing kyphosis and lordosis in the thoraco-lumbar spine. Acta Orthop Scand. 1981;52(5):525-9.
11. Baraúna MA, Canto RST, Sanchez HM, Bustamante JCF, Ventura-Silva RA, Malusá S. Validade e confiabilidade intra-indivíduo do cifolordômetro na avaliação da convexidade torácica. Rev Bras Fisioter. 2005;9(3):319-25.
12. Voutsinas SA, MacEwen GD. Sagital profiles of the spine. Clin Orthop Relat Res. 1986;210:235-42.
13. Baraúna MA, Adorno MLGR. Avaliação cinesiológica das curvaturas lombar e torácica das gestantes através do cifolordômetro e da fotogrametria computadorizada e sua correlação com a dor lombar. Fisioter Bras. 2001;2(3):145-55.
14. Iunes DH, Castro FA, Moura IC, Oliveira AS, Bevilaqua-Grossi D. Confiabilidade intra e interexaminadores e repetibilidade da avaliação postural pela fotogrametria. Rev Bras Fisioter. 2005;9(3):327-34.
15. Venturelli WS. Correlação das alterações posturais e da espirometria de crianças respiradoras bucais [dissertação]. Rio de Janeiro (RJ): Universidade Federal do Rio de Janeiro; 2006.
Temos um EBOOK Gratuito pra te Oferecer, o Ebook Fisioterapia em Lesão de Menisco. Basta clicar aqui
Se quiser receber mais textos como esse, entre no grupo de Whatsapp para receber textos e informações do nosso material.
Você pode ter um material mais aprofundado sobre esse tema. A Quero Conteúdo disponibiliza dezenas de materiais sobre Fisioterapia para estudantes e profissionais. Entre em contato com nossa consultora clicando na imagem abaixo!